19 junho 2012

RIO+30

O carvão, o petróleo e o gás são chamados combustíveis fósseis porque são compostos principalmente dos resíduos fósseis de seres remotos. A nossa civilização funciona pela queima dos resíduos de criaturas humildes que habitaram a Terra centenas de milhões de anos antes que os primeiros humanos aparecessem na cena. Como num terrível culto canibal, subsistimos dos corpos de nossos ancestrais e parentes distantes.” (Carl Sagan, Bilhões e bilhões)


Nossos bisavós acreditavam que a religião lhes servia para saber tudo o que precisava ser aprendido. E viviam muito felizes. Pelo menos foi essa a idéia que nos foi transmitida por nossos avós. Já os nossos pais, talvez eles pensassem que a coisa não era bem assim. Alguns deles, mais exagerados, chegavam a negar qualquer valor àquelas verdades dogmáticas. “O que a ciência não comprova eu não aceito”. Ou, como dizia o pai de um amigo meu, que, espelhando-se no exemplo paterno, um dia, jovem ainda, proclamou que ele também era ateu. Ou agnóstico, sei lá. “E você lá tem idade para não acreditar em Deus, Juca?” foi o sábio conselho que o futuro jornalista esportivo ouviu na ocasião. Já o Charles Darwin, esse descobriu que Deus por vezes escreve direito por linhas tortas. Resultado: o homem resolveu publicar suas anotações sobre a origem das espécies, por mais que isso desagradasse sua querida e carola Emma. E deu no que deu.

Graças à ciência aprendemos que a vida começou no mar, o verdadeiro pulmão da Humanidade. Um dia os peixes se cansaram daquele ir e vir infernal e resolveram tentar a vida cá fora. Parece que, de início, deslumbrados com o tamanho do céu, os antigos peixes resolveram explorar todo aquele espaço. Mas logo descobriram que bater as asas vinte e quatro horas por dia não estava com nada. Até porque precisavam de comer e de beber, se quisessem sobreviver. Talvez até dormir, coisa que, segundo dizem, até os peixes fazem. Aliás, botar ovos na maciez das nuvens, nem pensar, concluíram eles, sabiamente. E os peixes, que haviam evoluído para aves, agora evoluíram para mamíferos, coisa, aliás, que as baleias e os golfinhos já eram. Disso segue que, rigorosamente, o morcego não é um rato que voa, como geralmente se diz. Ao contrário, repare que as asas do morcego, cujo esqueleto mostra isso, até mesmo com unhas nas pontas, é o prenúncio do que seriam as pernas dianteiras do rato. A rigor, o rato é que é uma “evolução” do morcego.

O que acaba me levando de volta à religião. Ou, melhor, à sua forma disfarçada de invadir a área pretensamente científica, como a ciência do Direito, que se apóia em dogmas claramente religiosos. Obrigar um judeu ou um muçulmano a ser juiz em uma sala onde está pendurado o símbolo do cristianismo é, quando menos, um disparate. Mas isso é mantido pelos nossos juízes, em nome de algo que o Gilberto Gil, se entendesse do assunto, chamaria de “cultura”.

Um desses dogmas está presente na idéia de que o homem não evolui: é hoje o que foi sempre. Ele não foi criado à imagem e semelhança de Deus, mesmo que não saibamos como é a imagem de Deus? Pois então. O problema será buscarmos descobrir se essa mera semelhança não se tornou identidade. Identidade de quem com quem?

Dizem alguns estudiosos que o que faz a diferença entre o ser humano e os outros animais é capacidade de ter compaixão. Isto é, tentar sentir a mesma dor que o outro sente. Será?

Tudo o que nossos olhos e nosso olfato nos mostram é que os peixes e os macacos jamais haviam pensado em poluir o mar e os rios ou queimar as florestas para produzir mais gás carbono do que a atmosfera poderia suportar. Somente graças à “evolução” do ser humano é que esse “progresso” logrou ser alcançado.

Os verdadeiros cientistas sabem e dizem que a ciência consiste em um conjunto de conclusões que se baseiam naquilo que pode ser conhecido hoje. O amanhã a Deus pertence, diriam eles se dissessem o que pensam.

Diz-se também que todos os homens são bons e que o pecado é coisa natural no ser humano, motivo pelo qual devemos ser tolerantes para com esse sinal de nossa fraqueza, demonstração de que ainda somos apenas imagem, ainda não atingimos a perfeição que só Deus possui. Acontece que “crime” e “pecado” são dois conceitos que não se confundem, cientificamente falando. A penitência, que a teologia católica vincula ao pecado, nada tem a ver com a pena, que o Direito Penal vincula ao crime. O “olho por olho”, por sinal de origem religiosa, tinha por escopo, na área mundana, mostrar ao pecador o tamanho do mal que havia causado. Mataram 13 do lado de cá? Pois que morram 13 do lado de lá. Graças à contaminação religiosa, deu-se ao local onde os criminosos, nos países mais atrasados, devem ficar durante algum tempo, depois de condenados por uma autoridade civil, o sintomático nome de “penitenciária”. O estrago estava feito. Roubou cem ou roubou um milhão? Pena de três anos, com direito de liberdade provisória depois de alguns dias do início do cumprimento. Só não imita o criminoso quem for muito besta. Ou muito medroso.

Felizmente, para a sobrevivência de outros animais, a evolução do ser humano está a produzir o derretimento das geleiras do hemisfério norte da Terra. Com isso, o nível dos oceanos deve elevar-se sensivelmente nas próximas décadas, segundo os cálculos mais otimistas. O que bastará para fazer submergir as principais cidades que a inteligência humana fez construir nos litorais do mundo. A má notícia é que Brasília será poupada. Graças a isso os peixes voltarão a multiplicar-se, até porque não haverá o ser humano para dizimá-los com barcos pesqueiros providos de sonar. Com o tempo voltarão a voar. Depois terão as asas atrofiadas. Um belo dia aparecerá de novo na face da Terra um evoluído animal, andando sobre as patas traseiras, que se achará no direito de encerrar o ciclo evolutivo, dizendo-se o eleito de Deus. Com ele virá nova revolução industrial, produção de bens supérfluos sempre crescente para atender ao consumismo desenfreado, países lutando para preservar suas fontes de combustível e seus mercados cativos e tudo o mais que já conhecemos. 

E tome poluição.

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