Fui criado num lar cristão, mas
jamais me foi imposto aderir a este ou àquele ramo do Cristianismo. Na minha juventude,
quando ainda não se dizia que a única religião digna de tal nome era o
catolicismo, sendo as demais meras seitas, travei contato com autores sérios,
como Jacques Maritain, que me mostraram não haver incompatibilidade entre fé e
inteligência. A honestidade do padre Paul-Eugène Charbonneau, ao reconhecer que
eles padres haviam tantas vezes metido os pés pelas mãos, desgraçando a vida de
muitas pessoas que se deixaram levar por alguns de seus descabidos conselhos,
encantou-me. Em seu Moral Conjugal no
Século XX ele não deixa por menos: “Quisemos
fazer cristãos onde ainda não havia homens. O fato é que hoje não temos nem homens
nem cristãos”. Li Alceu Amoroso Lima e me encantei com sua visão humanista
da fé, a mesma visão que havia levado o advogado Sobral Pinto, católico de
missa diária, a defender comunistas, jamais por serem comunistas e sempre por
serem seus irmãos em Cristo. Entre o estilo duro do Tristão de Ataíde e a
leitura aprazível de um Lições de Abismo,
do “direitista” Gustavo Corção, eu creio que sabia distinguir entre fundo e
forma. Li tanto as obras de Helder Câmara como as de João Mohana. A leitura do Catecismo Holandês convenceu-me de que
era possível declarar-me católico e partir para leituras que meu despreparo e
falta de atrevimento até ali não me haviam permitido.
Um movimento de cristianização de
lideranças, nascido na Espanha, onde era considerado “de direita”, deu com os
costados no Brasil e, por força da influência da Teologia da Libertação, passou
a ser aqui considerado de “esquerda”, simplesmente porque falava em “direitos
fundamentais do ser humano”. Arrebatado pelos “Cursilhos da Cristandade”,
procurei acelerar meus conhecimentos da teologia católica, valendo-me do pouco
tempo que minhas atividades profissionais me permitiam. Tornei-me “rollista”,
ou seja, pregador e passei a divulgar, juntamente com outros leigos e
sacerdotes, os preceitos evangélicos nas trabalhosas e cansativas sessões de
fim de semana, para “cristianizarmos os ambientes”, como se dizia. Conservou-se
no Brasil o termo “rollo” para designar cada um dos cinco sermões diários com
os quais procurávamos incutir nos candidatos a “líderes cristãos” aqueles
preceitos.
Dentre tantos nomes conhecidos, ali
esteve, na casa da rua Marondésia, onde se realizavam esses encontros, até o
Eugênio Soares, cujo nome artístico já era sinônimo de inteligência e
sensibilidade. Tornou-se, graças aos Cursilhos, “ministro extraordinário da
eucaristia”, mister que desempenhava nas missas dominicais das dez horas na
Igreja de S. Gabriel, no Itaim Bibi. O fato de a fila de fiéis que preferiam
receber a hóstia das mãos do Jô Soares enquanto o sacerdote ficava segurando a
hóstia à espera de quem quisesse recebê-la de suas modestas mãos era apenas um
pormenor folclórico.
João XIII dizia que deveríamos estar
despertos para a movimentação dos ventos. E os novos ventos trouxeram o polonês
Woytila, figura carismática que sabia utilizar sua inegável vocação para o
teatro a serviço da Igreja. Muito embora batalhasse com afinco para mudar o
regime político de sua Polônia, proibiu os católicos da América latina de
misturar religião e política, algo que estava na base dos Cursilhos. Nosso
líder Leonardo Boff pagou com um primeiro “silêncio obsequioso”, imposto por um
bispo de formação teutônica, sua insistência em tentar identificar “cidade de
Deus” com “cidade dos homens”. Quando o mesmo cardeal Ratzinger tentou ir mais
adiante em sua blitzkrieg contra a Teologia
da Libertação, Boff preferiu falar de águias e galinhas e concentrar-se na
salvação do planeta.
Ironicamente, ninguém menos do que o
mesmo Ratzinger é escolhido pelo Espírito Santo para guiar o atônito rebanho,
que vê os templos católicos, em todo o mundo, transformarem-se em locais de
peregrinação meramente turística, ao mesmo tempo em que as “igrejas
eletrônicas” proliferam por toda parte, à custa da ignorância pragmática dos ingênuos
e da passividade das autoridades públicas civis.
Minha ignorância não é
tanta que eu desconheça a história da Igreja Católica e de seus principais
Papas, dentre os quais o insuperável Rodrigo Gil de Borja i Borja, convertido, em
inexplicável descuido do Espírito Santo, em Alexandre VI, pai de Cesar Bórgia e
Lucrécia Bórgia, três nomes que dispensam apresentação.
Aprendi com Agostinho de
Hipona que a fé nos testa a todo o tempo, o que ele expressou numa frase paradoxal:
“Pai, que eu creia!” Com S. Juán de la Cruz identifiquei-me na descoberta de
que entre a fé que tenho hoje e aquela que talvez eu volte a ter amanhã ou
depois de amanhã podem medear noches
oscuras, o que até me levou a desabafar:
Se tudo fosse como um faz de conta,
cabeça tonta que girasse ao vento
e o pensamento nos levasse longe
e a voz de um monge, de serena face,
nos ensinasse coisas do viver?
Talvez não ter com que preocupar-se;
melhor
calar-se que dizer tolice.
E quem nos diz se tudo isso é mentira?
E o mundo gira, qual um carrossel,
eu num corcel, saído do meu sonho,
onde inda ponho toda essa esperança.
Quem hoje dança? Que é da alegria?
Houvera um dia onde todos rimos;
depois saímos nós da juventude.
E quem se ilude quando há só velhice?
Quem foi que disse que há outra vida?
Gente iludida. A morte é que conta
e desaponta. Acabou-se o doce.
Tivesse
eu o talento inspirado do grande santo espanhol expressaria minha impaciência
com coisas belas como:
“¡Sácame de aquesta muerte,
mi Dios, y dame la vida;
no me tengas impedida
en este lazo tan fuerte;
mira que peno por verte,
y mi mal es tan entero,
que muero porque no muero!
Lloraré mi muerte ya
y lamentaré mi vida,
en tanto que detenida
por mis pecados está.
¡Oh, mi Dios! ¿Cuándo será
cuando yo diga de vero:
vivo ya porque no muero?”
Assim é a
vida. O dia-a-dia testando-nos em nossas convicções mais profundas. Quando, em
nome da lei, submeteram a adúltera a julgamento, quem atirou a primeira pedra?
Você atiraria, cumprindo ao pé da letra a lei de Deus? Aquele que os católicos
dizem ser o Filho de Deus limitou-se a dizer “Vai-te e não tornes a pecar”
(João 8,11), dando mais importância ao espírito do que à letra da lei. Como
diria Saulo de Tarso, “a letra mata, o espírito vivifica”.
Que faria aquele mesmo Jesus se uma aflita
mãe lhe pedisse que salvasse a vida da filha, uma menina de míseros 9 anos de
idade, grávida (de gêmeos!) por força de um estupro contínuo praticado por quem
deveria dar a ela exemplos de vida? Será que exigiria que aquela gravidez de
altíssimo risco chegasse a termo, talvez com a morte das três crianças?
Exigiria que aquela criança, caso chegássemos ao inesperável parto, visse pelo
resto de seus dias aquela lembrança viva da violência animalesca a que foi
submetida por quem traiu seus deveres mínimos de pai? Qual seria o valor
maior a ser preservado?
Não será
descabido recordar que esse apego à letra da lei era uma característica dos
fariseus, que o mesmo Jesus de Nazaré chamou de “sepulcros caiados”, pois eram,
segundo ele, “brancos por fora e podres por dentro” (Mateus 23,27).
Como quer
que seja, a assunção de um novo Papa sempre servirá para renovação de nossas
esperanças em um futuro mais cristão em nossas sociedades.
... é um Papa sem pompa, um homem comum, teve namorada na infância, tem um olhar sereno e afeto nas mãos, ... diriam, ... mas é Argentino, ... e daí, não se trata de enfrentamento futebolístico, o que devemos sempre combater, no bom sentido é o futebol, ... agora, quando se trata de enxergar um líder mundial, que ao que tudo indica, veio para guiar a humanidade, ... a reconstrução de sua hierarquia de valores, ... que venha o novo Papa, ... melhor que seja argentino, filho do sagrado barro vermelho missioneiro, ... pois, afinal, tem mostrado muita firmeza e bom senso, em suas intervenções, ... e quanto aos vilões que habitam os templos religiosos, bem como, os Palácios de Governo, ... não vamos esquecer, que está chegando o Agosto, ... então, Joaquim, ... 'cadeia neles', ...
ResponderExcluir