Plagium, entre os romanos,
significava apropriar-se de escravo alheio. Hoje em dia pode-se dizer que plágio significa “ganhar o pão com o
suor do rosto alheio”. Já tive oportunidade de discorrer sobre plágios,
reais ou supostos, inclusive os meus, e aparentemente eu não teria motivo para
voltar ao tema.
Confesso, porém, que o assunto me
parece sempre atual e surgiu uma oportunidade de ouro que eu não gostaria de
descartar. Até porque, como já ocorreu outras vezes, eu não digo nada sobre
determinada questão, aí vem alguém e diz tudo aquilo que eu havia pensado em
dizer mas não disse e eu terei dificuldade em me perdoar pelo meu silêncio,
especialmente se quem escreveu antes de mim for aplaudido por sua
originalidade. O sucesso alheio dói, como diria qualquer pessoa que fosse
honesta com seus sentimentos.
Aliás, talvez até alguém já tenha
escrito sobre isso e sobre aquilo que vou escrever e eu, involuntariamente, o
estarei plagiando, adotando, como adotei, o estilo Woody Allen de resmungar.
Assim é a vida.
Veja se não é.
Você acha que entende de cinema?
Então me diga que filme é este: um rapaz pobretão mas bem apessoado conhece uma
moça riquíssima que, além dessa nada desprezível qualidade, tem outra, também
nada desprezível, pois é belíssima. E ela acaba apaixonando-se por ele. Quer
enredo melhor? O problema é que ele tem uma noiva, que está grávida e exige que
ele assuma a paternidade do filho comum. A família da ricaça certamente não vai
gostar disso e ele então resolve dar um fim no problema, eliminando a namorada.
Que filme é esse?
Se você é fã de Woody Allen,
certamente respondeu que esse filme é “Match
Point”, cujo personagem masculino principal é um tenista. A expressão se
refere ao ponto que pode decidir uma partida, donde o filme haver-se chamado no
Brasil “Ponto Final”, expressão obviamente ambígua, que o Woody, se soubesse
português, certamente aplaudiria. Os tenistas conhecem bem a importância da
rede que divide a quadra. Ela tem atuação tão marcante nos jogos que há uma
tradição: quando o ponto é conseguido graças ao desvio da bola que toca a rede,
o ganhador do ponto pede desculpas ao adversário por essa lamentável
colaboração. Lamentável para quem perde, é claro. Por vezes, a bola bate na
rede e, em lugar de cair do outro lado, cai do lado onde está seu arremessador.
Há no filme uma cena que lembra isso e que terá enorme importância na trama: o
assassino atira a aliança da noiva defunta no mar, mas ela, tocando numa
mureta, cai do lado de cá, o que significa que a polícia, pelo nome que está na
aliança, chegará até o noivo. Ou não.
Acontece que eu falava de outro filme:
“Um Lugar ao Sol”, onde
o pobretão era interpretado pelo problemático ator Montgomery Clift. A
belíssima ricaça era ninguém menos do que a deslumbrante Elizabeth Taylor, por
quem, aliás, o Monty era apaixonado, mas jamais teve coragem de assumir isso,
talvez por suas tendências homossexuais. Em 1951, época em que George Stevens
dirigiu esse filme, a regra era “ajoelhou tem de rezar”. Que fazer, então, com
a namorada grávida para fugir do necessário casamento? Levá-la para um passeio
de barco, do qual ela não mais voltaria.
Veja os dois filmes e veja se o
Woody Allen, cinéfilo como ele só, poderia desconhecer essa trama, embora
adapte a história à moral cínica dos tempos presentes.
Pois em livro
escrito por Eric Lax, biógrafo de Woody
Allen, que reuniu na obra 36 anos de conversas com o cineasta, Allen fala sobre
“elaboração de roteiros, formação de elenco e representação, filmagem e
direção, montagem e escolha da música”, mas em nenhum momento nem o
entrevistado nem o entrevistador fazem referência ao filme de 1951.
Como o Woody Allen diz que tem uma
gaveta repleta de papeizinhos nos quais ele anota, diariamente, idéias para
filmes e contos, aí vai uma boa idéia para um filme: um jovem sul-americano, no
final do século XIX, insiste em criar um veículo que consiga flutuar no ar e
ser manejado por um piloto. Quando consegue inventar um desses aparelhos, a que
dá o nome de aeroplano, ele embarca para os EUA, a fim de mostrar seu evento a
alguns capitalistas. Obviamente ele vai de navio. No local onde será feita a
demonstração estão quase todos os magnatas, menos um, que está atrasado.
Cria-se um suspense que só é quebrado com a chegada do tal ricaço, que ali
comparece a bordo de um aeroplano, inventado recentemente por dois irmãos
norte-americanos.
Dá ou não dá uma excelente comédia?
Imagine o personagem, interpretado, como quase sempre, pelo próprio diretor,
andando de um lado para outro, gaguejando e tentando explicar que sua invenção
é anterior à dos dois irmãos inventores.
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