02 abril 2009

Mini-conto (II)


Ambos chegaram cansados. Sentaram-se num tronco de árvore, deixando as pastas do lado. Afrouxaram a gravata e se puseram a conversar.

- Lembras do Silva?

- Aquele um moreno, de bigodes?

- Sem bigodes. O que imitava peixes. Nunca vi imitador igual. Imitava truta, golfinho, bagre ...

- Mas golfinho não é peixe.

- Mas ele imitava golfinho.

- Então ele imitava mais do que peixe.

- Mais do que peixe, mas especialmente peixe: imitava bacalhau, salmão. Imitava lúcio, sôlha. Imitava lêmure.

- Lêmure é peixe?

- Sim, lêmure é peixe. Imitava marlim, peixe-serra ...

- Grande imitador, hein?

- Pois é. Morreu.

- De quê?

- Afogado.

- Que ironia do destino. O nosso Silva morrer afogado.

E mais não disseram. Dali mesmo levantaram vôo, pasta embaixo do braço. Lá foram eles, em direção ao sul, imitando pássaros. Canários, ou pelicanos. Talvez gaivota ou morcego. Sei lá. Não entendo muito de aves.

Um comentário:

  1. Adauto

    Legal,
    grande ironia,
    de tanto ele imitar a arte,
    a arte tirou-lhe a vida.
    bjs
    Doroni

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