09 agosto 2012

Olimpíada e patriotismo

“Jogos resgatam patriotismo britânico” (Jornal O Estado de S.Paulo, 09/08/12)


Qual a origem da mais clássica das provas olímpicas, a corrida da maratona? Segundo reza a lenda, após uma árdua batalha na região de Marathon, quando os persas acabaram desistindo de invadir a Grécia, no ano 490 a.C., o soldado Filípedes foi encarregado de avisar os seus compatriotas da vitória dos atenienses. Para isso, ele correu cerca de 36 quilômetros, para levar a boa-nova a seu povo. Depois de fazer o feliz anúncio, morreu de exaustão. A maratona seria, assim, uma homenagem àquele herói grego e, portanto, recordação de uma batalha sangrenta.

No civilizadíssimo jogo de tênis, até há poucas décadas exigia-se que os disputantes, homens ou mulheres, se vestissem como vestais, roupa impecavelmente branca. Foi uma brasileira, Maria Ester Bueno, como boa representante de nossa irreverência, quem quebrou a tradição, mandando bordar umas palmeirinhas na barra de sua saia. Pois ali temos um duelo a espada: por força das normas de civilidade, a ponta dessa arma mortal voltou-se em direção ao próprio punho e ali se fixou, para afastar o perigo de ferir o adversário.  Ficou um espaço vazio, ovalar, que foi coberto com um cordoamento, transformando-se em raquete. Não será, obviamente, por acaso que os jogadores usam a expressão matar o ponto, quando dão um golpe vencedor. Mata-se o ponto em lugar de matar o adversário.

Inúmeros esportes coletivos, tanto quanto o mencionado tênis, são disputados em torno de uma bola.  E que é a bola senão a simbolização da cabeça do adversário?

E os uniformes coloridos dos competidores? Realmente, quando uma tribo pretendia partir para a guerra, a primeira preocupação era pintar o corpo com cores muito vivas, o que, evidentemente, também estava sendo providenciado pela tribo adversária, com cor diferente. Para que isso? Para que, durante a refrega, o guerreiro não perdesse tempo tentando descobrir se a cabeça em que pretendia desferir o golpe de borduna pertencia a alguém de sua tribo ou da tribo adversária. Pela diferença de cor da tintura essa dúvida não teria mais razão de ser, ganhando-se tempo precioso.

O que acontece em muitas disputas coletivas é precisamente isso: cada tribo veste um uniforme que distingue seus componentes dos componentes do outro time.  Em lugar de lutar-se para conquistar a cabeça do adversário, ela já vem trazida pelo árbitro: a bola. 

E se isso não é bastante para convencer meu prezado leitor, responda: por que motivo, ao fim de uma disputa, o vencedor recebe uma taça?  Trata-se, ainda uma vez, de uma cerimônia simbólica: originalmente, era na taça que os vencedores bebiam o sangue dos vencidos, para se apropriarem do espírito dos derrotados, da coragem por eles demonstrada na luta.

Nas guerras, entretanto, a medalha não é colocada no peito dos soldados, como nas competições desportivas, mas no peito dos generais, que ficam protegidos dentro de uma casamata, vendo um monitor de televisão.

Quem disse que numa Olimpíada “o importante é competir” devia ser um tremendo gozador. Quem entra numa guerra para não derrotar o adversário? Evidentemente ninguém.

Quando se olha o quadro de medalhas da atual Olimpíada isso fica bastante claro: em lugar de uma disputa entre Estados Unidos e União Soviética, temos hoje uma disputa “desportiva” entre China e Estados Unidos.

Eu poderia falar ainda de atletas negros, de nome arrevesado, que estão competindo como representantes dos Estados Unidos, da Dinamarca e da Grã-Bretanha, mas aí a conversa tomaria outro rumo.

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